Politica

Quais lideranças se fortalecem e se enfraquecem no Ceará após os resultados da eleição 2022?

Especialistas apontam quais os impactos das urnas para os atores políticos no estado

O resultado das urnas na disputa eleitoral no Ceará aponta não apenas quem são os candidatos eleitos para o Executivo estadual e para as casas legislativas. Ele também repercute sobre as principais lideranças do estado, tanto fortalecendo a sua relevância no cenário local e nacional, como enfraquecendo a sua posição dentro do cenário político cearense.

O Diário do Nordeste ouviu cientistas políticos sobre os efeitos imediatos das eleições deste ano e eles são unânimes: o ex-governador e agora senador eleito Camilo Santana (PT) é quem ‘de longe’ sai  mais fortalecido após os resultados eleitorais no Ceará.

Não apenas pela eleição para um mandato de oito anos no Senado Federal com a maior votação para o cargo na história do Ceará, mas, principalmente, pela vitória do aliado e apadrinhado político, Elmano de Freitas (PT), para o Governo do Ceará – escolhido candidato nos instantes finais da pré-campanha eleitoral, após rompimento da aliança entre PT e PDT no Ceará. 

Por outro lado, Ciro Gomes (PDT) é apontado como quem mais perdeu com os resultados das eleições. O candidato a presidente figurou como quarto colocado na disputa nacional e ficou na terceira colocação no Ceará – onde, em pleitos anteriores, liderou os votos para a presidência da República. 

Além disso, viu o aliado Roberto Cláudio (PDT) aparecer apenas na terceira colocação na disputa pelo Palácio da Abolição. Tudo isso após uma campanha que expôs um racha no PDT no Ceará e desgastes entre Ciro e os irmãos, o senador Cid Gomes e o prefeito de Sobral, Ivo Gomes.

Fim de um ciclo político?

Professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará, Monalisa Torres aponta que o resultado do último domingo (2) “marca o fim de um ciclo político”, em referência ao período em que os irmãos Ciro e Cid Gomes se consolidaram como principais lideranças no estado.  

A docente diz que as primeiras sinalizações do enfraquecimento do ciclo liderado pelos Ferreira Gomes ocorreu ainda em 2020, com uma “diferença apertada” na vitória do agora prefeito de Fortaleza, José Sarto (PDT). 

“Se em 2020, nós vimos a vitória do Sarto, mas com margem de diferença muito apertada – indício do esgotamento de um ciclo –, eu vejo essa eleição como encerramento. Encerramento com a transição para uma nova era, com a emergência de Camilo como grande vitorioso”. 

Monalisa Torres Professora de Teoria Política na Uece

Com essa transição, passa a ser necessário observar, inclusive, como ocorrerá a consolidação dessa liderança, inclusive com a possibilidade de construir um grupo ‘camilista’.

“A partir desse seu fortalecimento, dessa prova viva da sua capacidade de negociação, de articulação e de mobilização eleitoral, é importante a gente ver nos próximos anos como é que ele consegue consolidar essa liderança a partir da formação de grupo e de uma articulação cada vez mais sedimentada”, concorda a coordenadora do Laboratório de Estudos de Política, Eleições e Mídia, Monalisa Soares. 

Enfraquecimento dos Ferreira Gomes 

O fortalecimento de Camilo ocorre no mesmo momento em seu ex-aliado e ex-padrinho político perde força. “Ciro talvez seja a liderança mais enfraquecida de todas. Perdeu muito”, ressalta o cientista político, Cleyton Monte. “Perdeu espaço nacional, perdeu espaço estadual e deve perder influência sobre o PDT”, completa. 

Outro padrinho político de Camilo Santana, Cid Gomes é um dos principais atores do ciclo Ferreira Gomes no Ceará, mas, ao contrário do irmão, não sai enfraquecido do pleito de 2022. Nem fortalecido. 

“O Cid talvez saísse fortalecido se tivesse 2º turno (no Governo do Ceará). Ele não manifestou apoio explícito (ao Elmano). O que vale na política é o apoio público. Não é que ele perdeu espaço, mas ele não cresceu politicamente”. 

Cleyton Monte Cientista político

O senador pedetista havia informado, em setembro, que iria “se preservar para o segundo turno”. A esperança de Cid era reatar a aliança entre PT e PDT e que ele pudesse ser o “cupido da renovação dessa aliança”, conforme disse em ato no começo do mês passado. 

Torres reforça que Cid se tornou importante “mais pela ausência do que pela presença”, por conta da habilidade de “articulador, de negociador”. E, cumprindo a máxima de que ‘na política, não existe vácuo de poder’, o ex-governador Camilo “cumpriu esse lugar, cumpriu esse papel”. 

Apesar disso, ao contrário de Ciro, Cid não se afastou de Camilo. Pelo contrário: ele chegou a fazer campanha para o petista chegar ao Senado, mesmo com o PDT apoiando a candidatura de Érika Amorim (PSD). 

Em entrevista nesta segunda-feira (3), Camilo agradeceu o apoio de Cid e disse que a relação dele com Cid “continua a mesma”. “De lealdade, de respeito, de gratidão”, completou. Mesmo sem conseguir cumprir o papel de “cupido” no segundo turno, essa é uma tarefa que ainda pode ser desempenhada por Cid, considera Torres. 

“Governo novo, com perfil novo, vai precisar reconstruir a base governista (na Assembleia Legislativa). É possível que o PDT seja chamado para compor, dado a oposição, que saiu fortalecida. Pelo menos, uma tentativa de composição, talvez por meio do Cid”, ressalta a docente.

O crescimento de Izolda Cela

Apesar de ter deixado para participar da campanha eleitoral apenas na reta final, a governadora Izolda Cela esteve no centro do processo de disputa estadual mesmo antes do início do período eleitoral previsto na legislação. 

O acirramento entre o nome dela e de Roberto Cláudio para ser a candidatura do PDT ao Governo do Ceará levou ao desentendimento dentro da aliança governista. A vitória de Roberto Cláudio em votação interna do partido, acabou levando ao rompimento e, na sequência, a desfiliação da governadora. 

Já durante a campanha eleitoral, ela foi alvo de denúncias da chapa formada por PDT e PSD por suposta “cooptação de prefeitos”. A ação na Justiça Eleitoral acabou ensejando embates públicos entre ela e Roberto Cláudio – o que levou lideranças como Camilo, Cid e Elmano de Freitas, entre outras, a se pronunciarem em defesa de Izolda. 

“A governadora Izolda sai fortalecida para os próximos pleitos. Eu acredito que sejam as duas forças (Camilo e Izolda), além do próprio Elmano, claro, que saem revigoradas”, afirma Cleyton Monte. Monalisa Torres lembra que, apesar de ser uma referência na implementação políticas públicas, Izolda “nunca tinha se dedicado ao trato político” até o pleito deste ano. 

“Ela sai forte. Não só pelo cargo que ocupa, mas como a imagem dela foi explorada na campanha”, ressalta. Ela projeta, por exemplo, que ela pode vir a ser convidada para um cargo no governo federal, caso o ex-presidente Lula (PT) seja o eleito no 2º turno da disputa presidencial. “E pode usar isso como vitrine. (…) Tendo um projeto de concorrer à eleição, ela estaria se cacifando para concorrer”.

Candidatos ao Governo do Ceará

A disputa pelo Governo do Ceará contou com três candidaturas competitivas. Além do vitorioso Elmano de Freitas, Capitão Wagner (União Brasil) e Roberto Cláudio (PDT) também disputaram a sucessão estadual. Os analistas políticos ouvidos pelo Diário do Nordeste se dividem quanto aos impactos positivos e negativos da vitória petista e da derrota dos adversários. 

Soares considera que Elmano, apesar de ter sido eleito governador, “ainda vai precisar se fazer, se mostrar”. “Para que ele possa, de fato, ser percebido como uma liderança emergente e significativa. Ele ainda é o candidato do ex-governador Camilo Santana que foi eleito no 1º turno”, ressalta.  

Sobre Capitão Wagner, que conquistou pouco mais de 31,7% dos votos válidos, Monalisa Soares aponta que o resultado das urnas é negativo. 

“A derrota no 1º turno é muito ruim para o Wagner. A própria eleição da sua mulher foi uma eleição não extensiva, com supervotação ou explicitude muito grande. (…) O Wagner sai enfraquecido, porque sempre tinha conseguido levar as disputas para o segundo turno, explorando essa zona de desgaste do grupo governista”. 

Monalisa Soares Coordenadora do Lepem/UFC

Ela admite, no entanto, que foram eleitos alguns candidatos ao legislativo do grupo de Wagner – fato que é apontado por Monalisa Torres como o saldo positivo do oposicionista após o resultado eleitoral. 

“Wagner, apesar da derrota, conseguiu articular uma oposição em torno dele. Esse legislativo mostra isso”, aponta Torres. “Ele é um candidato muito competitivo em 2024 (para a Prefeitura de Fortaleza). Ele não sai fraco. Para ele, pode ter sido um baque ter caído tanto, mas não foi de todo ruim”, ressalta. 

Cleyton Monte concorda: “Conseguiu liderar um movimento de ampliação de bancada. Ampliar espaço na Assembleia e na bancada da Câmara dos Deputados, (além de) uma votação importante para a Kamila (Cardoso), candidata ao Senado. Demonstra a sua força”. 

Legenda: Capitão Wagner não foi ao Comitê de Campanha após a derrota e concedeu entrevista de imprensa em escritório no bairro Meireles
Foto: Fabiane de Paula

Já Roberto Cláudio, terceiro colocado na disputa sai “enfraquecido”, considera Monte. “Teve um percentual muito reduzido. Perdeu inclusive em Fortaleza, onde se esperava que tivesse uma votação expressiva”, completa. 

Apesar disso, Monalisa Soares faz uma ponderação sobre os candidatos derrotados ao Governo do Ceará. 

“Tanto o Wagner quanto o Roberto Cláudio são lideranças jovens, são uma geração de políticos mais jovens que podem se reorganizar e se reposicionar ao longo dos próximos anos. Ainda que tenham saído enfraquecidos, acho que vale a pena observar as escolhas e os rumos”, ressalta. 

Legenda: Roberto Cláudio não foi até o comitê de campanha no domingo, se pronunciando pelas redes sociais nesta segunda (3)
Foto: Kid Júnior

Força no Legislativo

As eleições para a Assembleia Legislativa do Ceará e para a Câmara dos Deputados também mostram indicativos importantes, apontam os cientistas políticos. 

Um deles é a votação expressiva de candidatos do ‘bolsonarismo raiz’. André Fernandes (PL) e Carmelo Neto (PL), por exemplo, foram os candidatos a federal e estadual, respectivamente, mais votados no Ceará. “São nomes do bolsonarismo que mostraram força e resiliência no Estado”, ressalta Torres. 

“E são os bolsonaristas da ala mais ideológica, de mais alinhamento com o presidente (Jair Bolsonaro). Essas lideranças bolsonaristas saem fortalecidas nesse nível de organização para algumas figuras, ainda que eles não tenham conseguido levar o seu candidato ao 2º turno”, completa Soares.

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Marcio Sousa

Editor chefe, Radialista profissional e Diretor de Programação da Taperuaba 98,7 FM

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