Das dores às alegrias: 365 dias do Hospital Leonardo Da Vinci no cuidado aos doentes da Covid-19
Unidade de saúde pertencia à rede privada e foi reativada para tratar pacientes com Covid-19, em 23 de março de 2020. Desde então, foi palco de despedida, vitória contra a doença e da esperança vinda com a imunização
Cansado, sufocado, em luto. Mas se mantendo de pé, se apegando ao outro e à esperança para seguir. O que define quase todo cearense, após um ano de enfrentamento à pandemia de Covid-19, serve também para descrever o Hospital Estadual Leonardo Da Vinci (HELV) – ativo no combate à doença desde março de 2020.
Nesta terça-feira (23), a unidade de saúde completa 12 meses de atividade, desde que foi reativada para tratar exclusivamente pacientes com o novo coronavírus – que se espalhou rápido, agressivo, ocupando cada espaço do organismo e exigindo capacidade cinco vezes maior do que a inicial para atender à demanda.
“No pico do ano passado, em maio e junho, o hospital chegou à capacidade máxima planejada: 216 leitos ocupados, 150 de UTI e 66 de enfermaria. Ter profissionais com experiência para cobrir isso era o maior desafio”, relembra José Emídio Rocha, diretor do HELV, que tinha 30 leitos de UTI quando foi aberto.
Em outubro de 2020, o número de vagas exclusivas para Covid caiu para 34, quando o espaço começou a ser utilizado para cirurgias eletivas, diante da baixa na curva de casos. Mas mal se recuperou da primeira onda, e o HELV já se afoga na segunda: hoje, são 291 leitos para tratar a doença, cerca de 95% ocupados. Por pacientes cada vez mais jovens.
“O paciente fica muito grave mais rápido. Se antes ia à enfermaria e teria alta em 7 dias, hoje evolui e precisa de UTI por mais 14 dias, em média. Jovens, pessoas de 30 a 50 anos, muitos sem comorbidades, o que no primeiro momento era bem reduzido”, observa Dr. Emídio.
Um ano de cansaço
Entre um março e outro, médicos, enfermeiros, auxiliares, técnicos, fisioterapeutas, recepcionistas, psicólogos e outros tantos profissionais da saúde carregam uma bagagem humanamente impossível de levar sem dor: junto à estafa, se amontoam 4,2 mil internações e 1.552 mortes.
“Por mais que todo manual de psicologia diga pra não estabelecermos vínculo, é muito difícil. Somos a ponte entre o paciente e o mundo externo, somos a visita que eles recebem diariamente por 20, 30 dias. A gente cria vínculos”, confessa Narjara Bezerra, coordenadora do setor de Psicologia do HELV.
Além do desafio de cuidar da equipe de profissionais, ela aponta que assistir os pacientes e as famílias, sobretudo em momentos de luto, tem sido uma das grandes dificuldades em um ano de pandemia. “A Covid aproxima as pessoas. A gente se vê na dor do outro, tem mais empatia”, reconhece.
Lidar, sem desabar, com as próprias dores, com o medo e a frustração de encarar a ação de uma doença tão agressiva, segundo Narjara, requer horas de sono, alimentação e a consciência de que, às vezes, o máximo de si não será o suficiente.
“Há pacientes que você pode fazer tudo, mas não vai sobreviver. Muitos profissionais de saúde sequer sabem qual é o hobby deles, e não é raro terem um ou mais amigos e familiares contaminados. É preciso cuidar de si pra conseguir separar as emoções, se organizar”, pontua a psicóloga.
Alívio nas recuperações
Para aliviar o peso, por outro lado, vão noutra bagagem a lembrança dos primeiros cearenses vacinados contra a Covid, imunizados no Da Vinci; além da gratidão dos mais de 2.400 pacientes que tiveram alta registrada lá até domingo (21). “Pessoas que passaram pelo tratamento e voltaram para suas famílias”, como sorri, numa trégua, o diretor do HELV.
Um deles ficou estampado nas memórias afetiva e fotográfica da equipe: Rucley Cavalcante Braga, 49, que passou 53 dias internado no hospital – 43 deles na UTI, 30 intubado. Ao sair, e na impossibilidade de “dar uma lembrancinha a cada profissional”, expressou a gratidão numa faixa, na frente da unidade de saúde.
“Foi uma forma de agradecer a todo mundo, porque não tinha acesso às pessoas. Até hoje, alguém de lá me procura nas redes sociais pra conversar, saber como eu tô. Nomes não lembro, porque minha memória ficou um pouco prejudicada pela doença”, revela Rucley.
Além da memória, o olfato e a visão ainda não funcionam muito bem, desde o 12 de maio em que ele teve alta do Da Vinci, sequelas que mantêm a consciência em alerta. “É uma doença séria demais, torço pra que os profissionais consigam salvar mais vidas. E as pessoas precisam fazer a parte delas”, recomenda.
O apelo também vem do gestor de uma unidade de saúde que, um ano depois, continua operando no limite das capacidades espacial, física e humana.
“O que os médicos, enfermeiros, técnicos, serviços gerais e direção podem fazer está sendo feito, mas a outra parte fundamental é a população, o isolamento. Nós temos um limite de leitos, e os profissionais têm limite de trabalho. Não queremos que chegue um ponto em que nós não podemos dar a assistência a alguém”, alerta Dr. Emídio.
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