Politica

Cid Gomes no Conselho de Ética: o que é decoro parlamentar e como pode atingir um mandato

Nesta semana, diversos processos foram abertos no Congresso Nacional para analisar se houve quebra de decoro por parlamentares

O mandato em uma casa legislativa – seja em âmbito federal, estadual ou municipal – vem acompanhado de uma série de normas para orientar o comportamento dos parlamentares, o chamado decoro parlamentar. A quebra destas regras – previstas tanto na Constituição Federal como em Códigos de Ética próprios – pode acarretar em punições aos parlamentares e colocar em risco, inclusive, o mandato.

Na última quarta-feira (14), foram abertos diversos processos para investigar a conduta de deputados e senadores após denúncias de que estes parlamentares teriam descumprido estas regras.

Um dos processos abertos é contra o senador cearense Cid Gomes (PDT), acusado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de ter “agido em desacordo com o decoro de suas funções institucionais”. O episódio citado na representação ocorreu em 2019, quando Cid afirmou que Lira era um “achacador”

Já um fato mais recente foi o motivo de representação do PL contra seis deputadas federais do PT e PSOL, que, durante a votação do Marco Temporal, em maio, chamaram de “assassinos” os parlamentares favoráveis à medida – a denúncia resultou na abertura do processo no Conselho de Ética.

Nos dois casos, o mérito ainda não foi analisado. Contudo, a conclusão dos processos pode levar a sanções contra os parlamentares que vão desde censura verbal até a cassação do mandato legislativo.

E O QUE CONFIGURA A QUEBRA DE DECORO?

Segundo o glossário de termos legislativos do Congresso Nacional, o decoro parlamentar são “princípios e normas de conduta que orientam o comportamento do parlamentar no exercício de seu mandato”. A quebra deste, portanto, pode levar a medidas disciplinares. 

A Constituição Federal, promulgada em 1988, estabelece que está passível de perder o mandato o parlamentar que tiver “procedimento declarado incompatível com o decoro parlamentar”. 

Legenda: Processos por quebra de decoro parlamentar podem levar a cassação de mandato de deputados e senadores
Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

O texto cita dois pontos considerados incompatíveis com o decoro: o abuso das prerrogativas asseguradas a membros do Congresso Nacional e a percepção de vantagens indevidas. Além desses pontos fixados pela Constituição, cada casa legislativa possui um regramento próprio quanto ao que configura a quebra de decoro. 

Apesar da primeira cassação por quebra de decoro parlamentar ter ocorrido em 1949, os códigos de ética do Congresso Nacional, no qual são detalhadas quais são as condutas que ferem estas normas, são posteriores à Constituição de 1988. 

Na Câmara dos Deputados, por exemplo, os comportamentos considerados incompatíveis com o decoro parlamentar são: 

  • Celebrar acordo que tenha por objeto a posse do suplente, condicionando-a à contraprestação financeira ou à prática de atos contrários aos deveres éticos ou regimentais dos Deputados;
  • Fraudar, por qualquer meio ou forma, o regular andamento dos trabalhos legislativos para alterar o resultado de deliberação;
  • Omitir intencionalmente informação relevante ou, nas mesmas condições, prestar informação falsa nas declarações apresentadas ao conselho;
  • Praticar irregularidades graves no desempenho do mandato ou de encargos decorrentes, que afetem a dignidade da representação popular;
  • Perturbar a ordem das sessões da Câmara dos Deputados ou das reuniões de Comissão;
  • Praticar atos que infrinjam as regras de boa conduta nas dependências da Casa;
  • Praticar ofensas físicas ou morais nas dependências da Câmara dos Deputados ou desacatar, por atos ou palavras, outro parlamentar, a Mesa ou Comissão ou os respectivos Presidentes;
  • Usar os poderes e prerrogativas do cargo para constranger ou aliciar servidor, colega ou qualquer pessoa sobre a qual exerça ascendência hierárquica, com o fim de obter qualquer espécie de favorecimento;
  • Revelar conteúdo de debates ou deliberações que a Câmara dos Deputados ou Comissão hajam resolvido que devam ficar secretos;
  • Revelar informações e documentos oficiais de caráter sigiloso, de que tenha tido conhecimento na forma regimental;
  • Usar verbas de gabinete ou qualquer outra inerente ao exercício do cargo em desacordo com os princípios fixados na Constituição Federal;
  • Relatar matéria submetida à apreciação da Câmara dos Deputados, de interesse específico de pessoa física ou jurídica que tenha contribuído
  • para o financiamento de sua campanha eleitoral;
  • Fraudar, por qualquer meio ou forma, o registro de presença às sessões ou às reuniões de Comissão;
  • Deixar de observar intencionalmente os deveres fundamentais do Deputado. 


No Senado, os seguintes atos podem configurar a quebra de decoro:

  • Celebrar contrato com instituição financeira controlada pelo Poder Público, incluídos nesta vedação, além do Senador como pessoa física, seu cônjuge ou companheira e pessoas jurídicas direta ou indiretamente por ele controladas;
  • Dirigir ou gerir empresas, órgãos e meios de comunicação, considerados como tal pessoas jurídicas que indiquem em seu objeto social a execução de serviços de radiodifusão sonora ou de sons e imagens;
  • Praticar abuso do poder econômico no processo eleitoral.
  • A prática de irregularidades graves no desempenho do mandato ou de encargos decorrentes.
  • A atribuição de dotação orçamentária, sob a forma de subvenções sociais, auxílios ou qualquer outra rubrica, a entidades ou instituições das quais participe o Senador, seu cônjuge, companheira ou parente, de um ou de outro, até o terceiro grau, bem como pessoa jurídica direta ou indiretamente por eles controlada, ou ainda, que aplique os recursos recebidos em atividades que não correspondam rigorosamente às suas finalidades estatutárias;
  • A criação ou autorização de encargos em termos que, pelo seu valor ou pelas características da empresa ou entidade beneficiada ou contratada, possam resultar em aplicação indevida de recursos públicos.


FORMAS DE SANÇÃO AOS PARLAMENTARES

A responsabilidade por analisar possíveis infrações a estas regras cabe ao Conselho de Ética – que atua mediante a provocação da Mesa Diretora. Este ponto foi abordado pelas deputadas federais alvo de processo por quebra de decoro parlamentar durante a votação do Marco Temporal. 

Fernanda Melchionna (Psol-RS) acusou Arthur Lira de “seletividade” no encaminhamento das representações ao Conselho de Ética, já que teriam denúncias apresentadas pelo Psol a respeito dos atos golpistas de 8 de janeiro que ainda não chegaram ao colegiado. 

Sâmia Bomfim (Psol-SP) ressaltou o “tempo recorde” para chegada desta representação ao conselho e ressaltou que o processo se “trata mais uma vez” de “machismo”. A Coordenação da Bancada Feminina na Câmara dos Deputados também se manifestou sobre o caso. 

“É importante frisar também que existe uma sutileza na violência política de gênero e que tais representações são uma tentativa de silenciar as parlamentares, de impedir o exercício dos seus mandatos e de obstaculizar seus direitos políticos”, diz a nota da bancada. 

O mandato das deputadas, a depender do resultado do processo no Conselho de Ética, pode ser diretamente impactado. Entre as punições para a quebra de decoro parlamentar, está a perda de mandato e a suspensão de prerrogativas regimentais ou do exercício do mandato por até seis meses. 

No Ceará, o agora deputado federal André Fernandes chegou a ter o mandato na Assembleia Legislativa suspenso por 30 dias em 2020. Na época, ele acusou, sem provas, o então colega Nezinho Farias de integrar uma facção criminosa. Na Câmara dos Deputados, já foram apresentadas representações contra Fernandes, desta vez por causa dos atos golpistas de 8 de janeiro. 

Existe, entretanto, punições mais brandas, como a censura verbal ou escrita. No caso do Senado, além das sanções anteriores, também é prevista advertência no Código de Ética, que detalha quais infrações acarretam cada uma das punições.

No caso das mais graves, por exemplo, é necessário ter haver uma reincidência em condutas como “usar, em discurso ou proposição, de expressões atentatórias ao decoro parlamentar” ou “praticar ofensas físicas ou morais a qualquer pessoa” ou “desacatar, por atos ou palavras”, outro parlamentar, segundo o Código de Ética do Senado.  

Antes de chegar a definição se houve ou não quebra ao decoro parlamentar – e às consequentes punições -, existe a apresentação de defesa do parlamentar acusado e podem ser realizadas diligências para a reunião de provas. Além disso, qualquer conclusão precisa ser aprovada tanto no Conselho de Ética como no Plenário da casa legislativa. 

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Marcio Sousa

Editor chefe, Radialista profissional e Diretor de Programação da Taperuaba 98,7 FM

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