Apenas 4,1% das escolas do Ceará forneceram internet para alunos em aulas remotas em 2020
Dados são da 1ª pesquisa feita pelo Inep sobre as condições das redes pública e privada em 2020 com a interrupção de atividades presenciais na pandemia
Dificuldade para acompanhar as aulas remotas, conectar-se à internet, e acessar materiais online. Para alunos, professores e pais os dilemas na pandemia são conhecidos. E, nesse cenário, quantas escolas, em 2020, conseguiram garantir internet para a ocorrência das aulas em casa no Ceará? No universo de 6,9 mil unidades das redes pública (federais, estaduais e municipais) e privada, só cerca de 311, o equivalente a 4,1% dizem ter fornecido o acesso.
A condição que no dia a dia já era relatada, agora, consta na pesquisa “Resposta educacional à pandemia de Covid no Brasil”, feita pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), como um suplemento do Censo Escolar 2020.
As informações registradas pelas próprias escolas evidenciam a situação das redes de ensino no país inteiro e foram divulgadas na quinta-feira (8).
No Ceará, das 7,4 mil instituições com alunos matriculados em 2020, 95% responderam ao levantamento realizado entre fevereiro e maio de 2021, e que, de forma geral, coletou informações sobre: a organização do calendário escolar com a pandemia, as ações realizadas quando as aulas foram suspensas, e o retorno às escolas ainda em 2020.
Obstáculos no percurso
O cenário registrado pelas escolas do Ceará é de reiteração de dificuldades na garantia de internet no primeiro ano da pandemia. A condição varia em cada rede, sendo a realidade relatada pelas 28 escolas públicas federais, a melhor. Do total, 82% afirmaram que conseguiram garantir aos estudantes acesso gratuito ou subsidiado à internet em domicílio.
No caso das escolas da rede estadual, das 713 respondentes desta questão, 22,5% afirmaram terem fornecido internet ou subsidiado esse acesso. Já na rede municipal a situação é mais difícil, das 5.061 escolas, somente 1,3% conseguiu fornecer aos alunos conexão em casa. Na rede privada, das 1.182 respondentes, 3,9% disseram ter fornecido.
Em Fortaleza, o estudante da Escola Estadual de Ensino Médio (EEM) Dr. César Cals, Caio Vieria da Silva, 16 anos, foi um dos que vivenciou o ano letivo em condições atípicas. Em 2020, com a chegada da pandemia, o ritmo de estudo se alterou. Sem o apoio presencial e acesso aos equipamentos adequados, teve dificuldade em acompanhar as aulas.
“Ano passado eu tinha um celular muito simples e perdi muita aula. O celular não tinha muita memória e precisava instalar Google Meet, o aplicativo da sala de aula, os documentos para fazer atividade. Não dava” Caio Vieira Estudante da rede estadual
Neste ano, precisando cursar simultaneamente o 1º e 2º ano devido aos déficits deixados em 2020, Caio conta que conseguiu adquirir outro celular com a ajuda da família. “A escola deu um chip de internet, mas o meu não funcionou e eu devolvi para a escola”, detalha.
Para ele, o maior sonho é retornar ao presencial. Com saudade dos amigos, da sala de aula, das conversas, partilhar e até da presença mais próxima dos professores, considera o modelo mais efetivo.
Dificuldades também para professores
Assim como no caso dos estudantes, no item relativo ao acesso à internet em domicílio, a situação constatada na pesquisa para os professores também foi de pouca garantia por parte das escolas.
Das 6.913 unidades do Ceará que responderam, apenas cerca de 241, o equivalente a 3,5% conseguiram assegurar o acesso. Além disso, só 19,7% disponibilizaram, em 2020, equipamentos como notebook e tablets, e 69% garantiram treinamento para uso de métodos/materiais dos programas de ensino não presencial.
As informações da pesquisa evidenciaram ainda que:
- Só 63,3% das escolas municipais treinaram professores para uso de métodos/materiais dos programas de ensino remoto, e só 9,5% disponibilizaram equipamentos;
- Somente 7,9% das escolas estaduais e 2,4% das escolas municipais disponibilizaram equipamentos para uso do aluno (computador, notebook, smartphones, etc.);
- Apenas 20,1% das escolas municipais treinaram pais e alunos para uso de métodos/materiais dos programas de ensino não presencial.
Ceará espelha realidade brasileira
Para o presidente da Região Nordeste da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Alessio Costa Lima, secretário de educação da cidade de Palhano, os indicadores no Ceará espelham uma realidade que se repete em outros estados brasileiros.
Isso ocorre tanto em relação às entregas de equipamentos para professores e alunos, quanto acerca da realização de treinamentos para esse grupo. Considerando os desafios educacionais de adaptação ao novo modelo, Alessio percebe a pandemia como intensificadora de desigualdades já existentes.
“A Undime tem uma pesquisa que evidenciou os principais problemas enfrentados pela educação nesse momento de Covid-19 no Brasil, que é a questão de infraestrutura e conectividade, de acesso à internet,. A pandemia aflorou um problema crônico, que é essa desigualdade educacional”. Alessio Costa Lima Representante da Undime
Condições de 2021
O raio x do cenário vivenciado no segundo ano da pandemia, nas mais de 179 mil escolas do Brasil, só será divulgado oficialmente em 2022. Mas, no Ceará, as redes de ensino tem se mostrado mais adaptadas às condições impostas pela crise sanitária.
No que diz respeito à rede estadual, conforme o Governo, em 2020 foram adquiridos chips com pacote mensal de 20GB de internet móvel para 347 mil estudantes, tanto das escolas como para alunos de baixa renda das universidades estaduais. Outra iniciativa informada é que, em 2020, foram entregues às escolas estaduais kits gravação, com computador, câmera e tripé.
Já em 2021, a Secretaria assegura que está distribuindo 150 mil tablets aos alunos que ingressaram na 1ª série do Ensino Médio, e está em andamento um nova aquisição de mais de 150 mil tablets.
Diante da necessidade de reduzir os impactos principalmente para os estudantes de baixa renda, o representante da Undime, Alessio, avalia ser essencial a execução de políticas nacionais de apoio aos estados e municípios.
“No Brasil, a gente percebe que faltou uma coordenação nacional. Na área da educação observamos total ausência na pandemia. Há essa lacuna de uma coordenação nacional que orquestrar ações direcionadas. A gente não teve nada novo, nenhum novo programa criado”
Por isso, apesar do percentual pequeno de distribuição dos equipamentos em estados e municípios, ele avalia que o número representa aquilo que as gestões locais conseguiram fazer a partir de uma política de incentivo.
Esse mês, o Governo Federal recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para não ter de oferecer conexão à internet para alunos e professores de escolas públicas, conforme estabelecido em Lei aprovada no Senado em fevereiro.
A norma prevê o uso de parte do Fundo de Universalização do Serviços de Telecomunicações (FUST) para financiar o acesso à internet. Pela proposta, a União deve repassar cerca de R$ 3,5 milhões para que estados e municípios invistam em ações que viabilizem o acesso à internet para fins educacionais.
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