Sem aporte ideal, Ceará passa a depender de 4 açudes em 2017
As perspectivas para 2017 em relação às chuvas ainda são de incertezas. Por enquanto, o cenário é bem ruim. O Ceará vai chegar a janeiro do próximo ano com menos de 6% das reservas nos 153 açudes monitorados pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh), isso representa pouco mais de 500 milhões de metros cúbicos de água, dos 18,6 bilhões m3 da capacidade total.
E o pior, se não chover pelo menos na média histórica para março/abril, cerca de 200 mm/mês, o Estado passa a contar somente com quatro grandes reservatórios para a sobrevivência humana, animal e agricultura. São eles, o Orós, que já garante o Castanhão desde setembro passado, para Fortaleza e Região Metropolitana (RMF); Araras, para a região Norte; o Pedra Branca, Crateús, Quixadá, Quixeramobim; e o Arneiroz 2, para a região dos Inhamuns. A análise é do presidente da Cogerh, João Lúcio Farias.
Entre as ações emergenciais para assegurar o abastecimento para comunidades da RMF e Baixo Jaguaribe, informa ele, a Companhia já reverteu o sentido das águas do Canal do Trabalhador que passou a operar destino Capital/Sertão. “Ele foi construído em 1993 para garantir Fortaleza. Agora, com o Rio Jaguaribe praticamente seco, as populações por onde o canal passa só dependem dele agora para viver. São pelo menos 20 mil pessoas que precisam diretamente dessa água”, afirma.
Segundo explica, o Rio Jaguaribe tem 160Km de extensão e atualmente a água só pereniza 100Km, chegando até Russas. “Foi preciso tomar essa decisão em benefício das famílias que moram dali até Pacajus. “Então, a água sai próxima de Fortaleza em direção ao sertão”, informa.
Rotina
A dona de casa Sergiana Falcão, o agricultor Francisco Barros e o pescador Manuel Rodrigues de Lima sabem bem o que é isso. “Ando meia hora para buscar água no canal. Se não fosse ele, acho que a gente já teria morrido. Não falo nem no gado, esse coitado, todo dia morre um e não podemos fazer nada e isso doi muito”, lamenta ela, moradora da comunidade Brito, município de Chorozinho.
Francisco Barros, da comunidade Cedro, critica a falta de desejo político para levar água do canal para a sua localidade. “São apenas três quilômetros. Estamos tão perto e ao mesmo tempo tão longe da água. E era só pouca coisa de tubulação para diminuir nosso sofrimento de todo dia andar a pé ou de carroça em busca da água. Tem gente comprando”, desabafa.
Comportas
O pescador Manuel Rodrigues de Lima mora do distrito Antônio Laurino, conhecida como Beco do Sinal, em Cascavel. Para levar comida para casa e alimentar seus quatro filhos e esposa, ele percorre diariamente o canal e nas tentativas de jogar a tarrafa, conseguir o peixe tão necessário. “A água do canal baixou nos últimos tempos e nosso medo é que eles fechem as comportas. Se isso acontecer, ou vamos morrer ou arrumar dinheiro para comprar”, lastima.
A possibilidade é descartada pelo presidente da Cogerh. Segundo ele, tudo está sendo feito em termos de gerenciamento hídrico para o Estado enfrentar 2017 num pior cenário. Entre as estratégias, o racionamento de água para Fortaleza, para fim de janeiro e início de fevereiro já é fato quase concreto.
Outra medida, essa também de maior impacto e que pode gerar críticas, é reduzir ainda mais o suprimento liberado destinado à agricultura, hoje em apenas 30%. “Além disso, investimos aquíferos subterrâneos, como o Campos de Dunas, entre Paracuru e Pecém; na Serra Grande, na Ibiapaba, com essa água sendo injetada na rede da Cagece ou dos sistemas municipais, os SAS. Somamos mais de duas mil ações, entre poços, instalação de dessensibilizadores e chafarizes”, ressalta.
Na avaliação do professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e Phd em Mudanças Climáticas Alexandre Costa, é preciso mais. É evidente, aponta, que algumas medidas drásticas precisam ser tomadas, o que inclui a suspensão do funcionamento das termelétricas, o estabelecimento de uma iniciativa para rápida diminuição das perdas e a revisão de todas as outorgas para grandes consumidores. “O que fica claro, quando o governo se recusa a adotar essas medidas, é uma violação flagrante das leis federal e estadual de recursos hídricos, já que esta prevê, em caso de escassez, a suspensão de outorgas sem indenização para salvaguardar a prioridade do abastecimento humano”.
Alexandre endossa o que a Funceme e Secretaria dos Recursos Hídricos já adiantaram. Na ausência de um sinal forte no Pacífico, são as condições do Atlântico que predominam. Estas podem mudar rapidamente até mesmo dentro da estação chuvosa, o que aumenta a incerteza na previsão. “O ideal seria que o Atlântico se configurasse com temperaturas abaixo do normal ao norte e acima do normal ao sul, mas hoje estamos longe desse cenário”, reitera.
Segundo ele, o alerta está ligado e cita a situação do Açude Castanhão. É o maior reservatório cearense e, se não fosse o Orós, já estaria seco, o que pode acontecer nos próximos meses. Atualmente, está com 5.3% de sua capacidade total.
Numa conjuntura, frisa, de lençol freático baixo, solo muito seco, rios e açudes quase sem água, mesmo se a quadra chuvosa, entre fevereiro e maio, registrar boas precipitações, a situação não vai melhorar imediatamente. Primeiro, explica, elas deverão molhar o solo, saturar o subsolo e então escoar para os corpos hídricos.
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