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Médicos relatam falta de medicamentos, espaço e pessoal para enfrentar Covid nas UPAs em Fortaleza

Insumos como sedativos do “kit intubação” têm faltado nas unidades de atendimento lotadas nesta segunda onda da pandemia

Acordar enquanto está intubado, além de contra recomendado, é “desesperador”. A situação, porém, tem sido recorrente entre pacientes com Covid nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) de Fortaleza, assim como superlotação, falta de insumos e de profissionais.

O cenário foi descrito por médicos que atuam em três dos 12 equipamentos municipais e estaduais situados em Fortaleza. Os profissionais terão a identidade preservada sob nomes fictícios, a pedido deles.

Sobre a falta de medicamentos do chamado “kit intubação”, as próprias distribuidoras já alertaram que “a qualquer momento podem faltar em qualquer hospital” público ou privado. A Secretaria Estadual da Saúde (Sesa) requisitou, na última terça (23), estoques de 26 dessas empresas, para evitar desabastecimentos.

“Faltam principalmente medicamentos para sedação do paciente, como fentanil, que faz com que a pessoa não sinta dor quando está intubada; e o midazolam, que induz o sono. Esses dois estão em constante falta nas UPAs, com abastecimento muito irregular”, revela João*, um dos médicos ouvidos pelo Diário do Nordeste.

Segundo ele, o cenário põe os profissionais de saúde da linha de frente em uma “sinuca de bico”, já que muitos pacientes precisam do tubo para respirar, mas não conseguem permanecer com ele de forma indolor sem a medicação. “A situação de estar intubado é desesperadora, ele precisa estar sedado, dormindo. E quando a medicação falta, ele abre o olho, acorda, vê as coisas, se agita. É uma situação bem dramática”, relata o profissional.

O problema também tem sido presenciado por Maria*, que atua em duas unidades na Capital. Ela descreve que além da medicação para intubação, outros insumos necessários ao processo, além de equipamentos hospitalares e fármacos como antibióticos e anticoagulantes, têm se esgotado frente à demanda.

“O cenário de escassez é amplo e envolve os mais diversos eixos: alimentação, antibioticoterapia, anticoagulação e, claro, a sedação do paciente intubado. Outra questão é a pouca disponibilidade de ventiladores mecânicos, por causa da superlotação nas unidades”, aponta a profissional.

Foto: AFP

A insuficiência de respiradores tem gerado situações graves, aumentando a necessidade de transferência de pacientes das UPAs a hospitais. “Enquanto não é transferido, temos que intubar o paciente e tentar manter sua vida segurando a oxigenação manualmente. Uma colega médica chegou a passar 12h em pé com a equipe de enfermagem fazendo isso”, relembra a médica.

Em nota, a Sesa informou que “as seis UPAs de gestão estadual se encontram abastecidas com medicamentos de mesma base farmacológica que são utilizados no processo de intubação”. A Secretaria de Saúde de Fortaleza (SMS) não enviou posicionamento até a publicação deste texto.

“Passamos perrengue nos plantões”

Outra questão que “está virando rotina” em meio à superlotação das UPAs em Fortaleza, na segunda onda pandêmica, é a falta de macas e de espaço: com muitos pacientes chegando ao mesmo tempo, os recursos se tornam insuficientes. “Estamos passando muito perrengue nos plantões, estão super exaustivos. Não tem mais onde colocar paciente. Muitas vezes eles necessitam de cuidados intensivos, reanimação, em parada cardíaca, e já aconteceu de não ter maca. Precisei reanimar paciente no chão. Isso acontece, não é fantasia”, alerta João*.

A Sesa reforçou, em posicionamento enviado à reportagem, que “cada UPA 24h possui dois leitos na sala vermelha, utilizados em pacientes em estado crítico e em casos de reanimação, até a sua estabilização”. Após esse processo, “o paciente é transferido para outro leito, tornando vago novamente o de sala vermelha que possui alta rotatividade”.

Em nota, a Prefeitura de Fortaleza destacou a ampliação da capacidade de atendimento das 12 UPAs localizadas no município, entre fevereiro e março, da ordem de 177%.

“A Rede Municipal de Saúde de Fortaleza, na qual as UPAs fazem parte, atua de forma integrada, com base na Central de Regulação de Leitos do Município, e com foco permanente na gestão de insumos segundo os perfis dos pacientes”, diz a nota.

“Tive colega que saiu para internação psiquiátrica

Se o cansaço abate toda a população, é mais agressivo ainda em se tratando dos profissionais de saúde. João* confessa que a mistura de medo de contrair Covid e falta de recursos para atender pacientes gera uma bomba de cansaço.

“É uma situação caótica, e entendemos que os gestores estão pressionados. Mas a gente tá exposto, tem medo. Todo mundo tem, só um louco não teria. O profissional de saúde está se empenhando ao máximo. Todos eles: enfermagem, fisioterapia, nutrição. Infelizmente, não conseguimos evitar. A gente trabalha com o que tem”, finaliza.

Maria* reitera que a sobrecarga das equipes, que ainda precisam arranjar tempo para contatar as famílias de pacientes, tem sido adoecedora – não só física, mas mentalmente.

Legenda: Imagem divulgada por profissionais de saúde em março de 2020
Foto: Reprodução

“Os profissionais de saúde estão completamente exaustos. Já tive colega que saiu para a internação psiquiátrica, outro que teve crise de ansiedade durante o plantão e não conseguiu continuar, e eu tive que fazer o meu trabalho e o dele. As assistentes sociais estão completamente destruídas física e psicologicamente”, finaliza.

No Ceará, até as 11h48 deste sábado (27), mais de 522 mil pessoas já foram infectadas e outras 13.508 morreram em decorrência da Covid. Na última sexta-feira (26), o governador Camilo Santana prorrogou o isolamento social rígido até 4 de abril, e frisou que a retomada das atividades dependerá de avaliação dos indicadores de saúde ao longo da próxima semana.

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Marcio Sousa

Editor chefe, Radialista profissional e Diretor de Programação da Taperuaba 98,7 FM

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