Chacina das Cajazeiras: preso e denunciado, cinco anos depois, homem foi inocentado
A reviravolta na ação penal vem a partir do momento em que a defesa deste réu consegue desmembrar o processo e não surgem provas “diretas ou indiretas
Por quase cinco anos, o nome de João Paulo Félix Nogueira, o ‘Paulim das Caixas’, esteve na lista dos acusados por uma das maiores chacinas do Ceará neste século, a ‘Chacina das Cajazeiras’. Contudo, o desenrolar do processo não apontou provas suficientes que indicassem a participação dele no massacre e o levou a ser inocentado.
Foram cerca de 1.700 dias de prisão até que a Justiça do Ceará impronunciasse o réu. ‘Paulim’ nunca chegou a ser indiciado pela Polícia Civil do Ceará, mas permaneceu sob acusação do Ministério Público do Ceará (MPCE), que o apontou como conselheiro de uma facção criminosa local e líder do tráfico de drogas no Conjunto Habitacional Cidade Jardim, no José Walter, “que consentiu com a efetivação da chacina”.
A reviravolta na ação penal vem a partir do momento em que a defesa de João Paulo consegue desmembrar o processo e não surgem provas “diretas ou indiretas, sobre as condutas delitivas a ele imputadas”. Semanas antes da matança completar cinco anos, foi expedido e cumprido alvará de soltura, colocando ‘Paulim das Caixas’ em liberdade.
A reportagem tentou contato com o homem, que preferiu se pronunciar por meio do advogado de defesa Leonardo Pontes. De acordo com o advogado, “foram cinco anos dolorosos e irreparáveis fruto de uma injusta acusação“.
REVIRAVOLTA DO CASO
Em 2018, o MP apresentou denúncia acerca da ‘Chacina das Cajazeiras’ e a peça foi acolhida no Judiciário. Na época, os denunciados João Paulo Félix Nogueira, Deijair de Souza Silva, Noé de Paula Moreira, Misael de Paula Moreira, Francisco de Assis Fernandes da Silva, Auricélio Sousa Freitas, Zaqueu Oliveira da Silva, Ednardo dos Santos Lima, Rennan Gabriel da Silva, Fernando Alves de Santana, Francisco Kelson Ferreira do Nascimento, Ruan Dantas da Silva, Joel Anastácio de Freitas, Victor Matos de Freitas e Ayalla Duarte Cavalcante foram citados para responderem à acusação por escrito, no prazo de 10 dias.
A defesa de João Paulo apresentou resposta à acusação em 13 de fevereiro de 2019 indicando: tipicidade da conduta do denunciado; falta de justa causa e inépcia da denúncia. O acusado negou ter participado do crime e disse que não foi interrogado perante a autoridade policial, “muito menos teve a sua prisão temporária requerida pelos delegados de Polícia que presidiram o inquérito policial, não constando sequer seu indiciamento no relatório conclusivo apresentado pela autoridade policial”.
A defesa apresentou ainda a tese que o nome de João Paulo não foi citado pelas testemunhas, inclusive aquelas protegidas, e nem pelos demais acusados, requerendo assim a rejeição da denúncia.
O acusado pediu o desmembramento do processo, obtendo decisão favorável proferida pelo relator desembargador Mário Parente Teófilo Neto. A partir disso, a ação penal tramitou paralelamente ao processo principal.
Em junho de 2022, o acusado foi interrogado e negou a autoria ou participação nos fatos narrados na denúncia. Consta nos autos que ele sustentava a versão de que “jamais traficou drogas, nunca fez parte de organização criminosa, muito menos é líder de comunidade ou facção criminosa, ou líder do tráfico de drogas, nunca foi acusado da prática de homicídios consumados ou tentados, ou por tráfico de drogas, que em relação a esta acusação, não foi indiciado, não foi apontado ou reconhecido por qualquer testemunha, muito menos pelos demais réus, dos quais conhece o Victor, pelo fato dele morar no mesmo Bairro, e que sobre a sua prisão por ocasião de um velório/sepultamento, afirma que não foi encontrado com arma de fogo, mas foi conduzido preso para a Delegacia, juntamente com outras pessoas que estavam armadas, e que ficou preso porque estava com documento falso, obteve alvará de soltura, mas continuou preso em razão do mandado de prisão extraído destes autos”.
Ao longo das oito audiências de instrução processual também foram inquiridas 14 testemunhas e vítimas sobreviventes.
No último mês de julho, o MPCE apresentou os memoriais finais, pedindo a pronúncia de 12 réus e a impronúncia de Francisco de Assis Fernandes da Silva e João Paulo. A defesa de João destacou nos autos que: “Quando o Ministério Público delibera pela impronúncia de um réu, isso equivale a retirar a acusação”.
IMPRONÚNCIA
A sentença de impronúncia que decidiu não levar o acusado a júri veio no dia 6 de janeiro deste ano. O juiz da 2ª Vara do Júri destacou que “a instrução preliminar é realizada para identificar a existência, provável e/ou possível de um crime da competência do Tribunal do Júri, afastando acusações infundadas, levianas, temerárias e/ou desprovidas de lastro probatório mínimo”.
“Não se trata de “burocraticamente” pronunciar acusados, sem observar a gravidade, o risco e as consequências que representa submeter alguém ao julgamento dos juízes leigos, sem a aferição dos elementos probatórios suficientes (verossimilhança) de autoria e materialidade”
O magistrado foi de acordo com o mais recente parecer do Ministério Público de que “não restou confirmado, apesar de possuírem forte motivação, conforme já foi dito em relatórios anteriores, a participação de João Paulo Félix Nogueira”.
“Em Juízo, as vítimas e testemunhas inquiridas não se reportaram ao nome do acusado, não se registrando nos depoimentos colhidos indicativos da sua participação nos fatos relatados na denúncia, confirmando a conclusão da autoridade policial quanto a inexistência de elementos hábeis e convincentes da suposta autoria intelectual e/ou qualquer participação na Chacina das Cajazeiras, corroborando a versão apresentada pelo acusado no seu interrogatório judicial, e a tese defensiva sustentada pela defesa técnica. Neste ponto,resta evidente que a prova colhida nessa primeira fase do procedimento converge no sentido de recepcionar as declarações e explicações fornecidas pelo acusado e ratificada por seus ilustrados advogados”, conforme a decisão.
O juiz entendeu como improcedente a acusação, mas não a pretensão punitiva do Estado, permitindo que se houver provas o Ministério Público apresente outra denúncia: “Absolve-se o acusado da instância, à proporção que não há lastro para a acusação, mas não da causa, uma vez que não se julga a pretensão punitiva. Nesta toada, a sentença de impronúncia é uma decisão terminativa, em que se afirma a inviabilidade da acusação e ” que não impede processo de conhecimento cível para responsabilização do sujeito, dada a natureza nitidamente processual da decisão de impronúncia, na esfera penal”.
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