Aulas remotas continuarão até o fim de 2021? Entenda a resolução do Conselho Nacional de Educação
O texto com as diretrizes nacionais ainda deve passar por revisão do próprio Conselho e será encaminhado ao Ministério da Educação (MEC) para homologação
“O lápis e o caderno do século vinte e um vão ser internet e banda larga, goste ou não, seja a favor ou não, mas vai ser o mundo agora. Os governos têm que se replanejar e a pandemia mostrou como eles não estavam antenados”
É assim que o educador Mozart Neves Ramos resume a necessidade de mudanças no ensino, acelerada pela atual crise sanitária mundial, e que levou o Conselho Nacional de Educação (CNE) a aprovar, por unanimidade, uma resolução que autoriza a prorrogação de atividades remotas para o ensino básico e superior, sejam instituições públicas, particulares ou comunitárias, até 31 de dezembro de 2021.
O texto com as diretrizes nacionais ainda deve passar por revisão do próprio Conselho e será encaminhado ao Ministério da Educação (MEC) para homologação.
As redes de ensino, por sua vez, terão a liberdade para aderir ou não à proposta. Mas o que se sabe, até o momento, sobre tal resolução? Quais serão os seus efeitos práticos?
Para começar, a resolução tem como intuito regulamentar alguns pontos da Lei Nº 14.040, de agosto, que estabelece normas educacionais a serem adotadas, em caráter excepcional, durante o estado de calamidade pública decorrente da pandemia do Covid-19.
A resolução original previa que o modelo remoto fosse permitido somente até junho do ano que vem. No entanto, os próprios representantes das redes e instituições de ensino defenderam a ampliação do prazo por mais um semestre, em audiência pública promovida pelo CNE, afirma Ramos, que é membro do Conselho e catedrático da Universidade de São Paulo (USP).
Flexibilidade
Segundo ele, ao contrário do que parece, a resolução não orienta a substituição das aulas presenciais por aulas remotas até dezembro de 2021, mas deixa aberta a possibilidade de adoção do modelo.
Sobretudo, diante de um eventual cenário no qual o Brasil seja obrigado a enfrentar uma segunda onda do novo coronavírus. Um segundo ponto considerado pelo CNE na elaboração da resolução, justifica Ramos, é que também existe a possibilidade de o número de vacinas contra o coronavírus não ser suficiente para todos os alunos.
“A gente não quis criar amarras, engessar e preferiu ser precavido. A nossa preocupação é que, se a gente tira essa possibilidade, e, de repente, tem que retornar com o ensino online, vamos ter que fazer um novo parecer”.
Além disso, o ensino híbrido é um modelo de aprendizado que, para ele, tende a ser mantido. “Não é que todo mundo vai continuar no [ensino] remoto. Eu entendo que os sistemas, as redes de ensino, essas instituições de educação superior, de educação básica vão procurar, daqui por diante, incorporar esse conceito do ensino híbrido. O que não é simplesmente pegar uma parte presencial e uma parte online, mas integrar novas metodologias, usando tecnologias no ensino presencial”.
Pelo fato de o Brasil ter dimensões continentais, emenda o professor, é importante haver essa flexibilidade. “A pior coisa num país grande como o Brasil, muito díspare, é você fazer uma norma única de engessamento e dizer: ‘acabou o ensino remoto a partir de 2021’. Vamos deixar isso dentro do plano de atividades de cada instituição, de cada rede, de cada sistema de ensino, em conformidade com o seu projeto pedagógico”.
Limitações
Apesar de já observar alguns avanços metodológicos no ensino remoto, tanto por professores como alunos, a estudante do 2º ano do ensino médio, Laís Souza, vê com preocupação a possibilidade de prorrogação do ensino remoto no Brasil.
Para ela, as desigualdades “gritantes” impedem que o ensino remoto seja plenamente aplicado. “Além de muitas pessoas não terem acesso, é um modelo que tem limitações e que atrapalham porque a gente não consegue render como deveria. O professor também não consegue ajudar como poderia. Querendo ou não, o ensino à distância tem prejudicado os alunos”.
Política pública
O membro do Conselho admite que muitos alunos tiveram dificuldades de acesso e de adaptação às aulas online no País. Especialmente os da rede pública de ensino.Por isso, defende que a atividade remota faça parte do planejamento escolar das redes, dos sistemas de ensino.
“Isso vai ter que estar dentro da política pública da Educação. Isso vai exigir do MEC, que tem papel de coordenar de maneira articulada com estados e municípios, um programa de conectividade sólido e abrangente pra todos os alunos”.
Um “caminho” para se chegar à solução, aponta Ramos, é utilizar recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), instituído em 2000 para financiar a implantação de serviços do setor – especialmente para a população mais carente – que não seriam normalmente prestados pelas companhias privadas devido a fatores como custos e baixo retorno.
“O Fust tem recursos da ordem de R$ 32 bilhões e um estudo encomendado pela CNI [Confederação Nacional da Indústria] mostra que, para ter conectividade de todos os alunos, precisaria de R$ 20 bilhões. Se usar recursos do Fust com os recursos dos próprios governos [estaduais e municipais], a gente vai ter como gradualmente se planejar pra que todo aluno tenha a conectividade necessária para estudar de forma híbrida”.
Inclusive, lembra ele, todo aluno deve desenvolver a cultura digital, conforme regulamenta a própria Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
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